quinta-feira, 5 de maio de 2011

ep. 10 - NAS MELHORES FAMÍLIAS

Guto não estava com a menor vontade de ir ao aniversário dos 80 anos da avó Aurora. Mas o pedido intimativo da mãe o convenceu. Iriam estar todos os filhos, netos, bisnetos e agregados num sítio alugado para a festa.
Guto morava em São Paulo desde os 12 anos. Quando o pai se aposentou e voltou pro interior, ele estava na faculdade e foi ficando, ao mesmo tempo em que perdera o contato com praticamente toda a família. Vez ou outra via, além da Vó Aurora, a tia Marlene, sua madrinha, e mãe de Tiago. Um moreno mirradinho, chato, que só chorava. Reencontrá-lo seria um porre.
Viajou na sexta à noite e às 10 da manhã do sábado, com os pais, chegava ao sítio. Logo em seguida, Beth, sua irmã, com o marido e seus três filhos. As únicas crianças que Guto realmente amava.
Vó Aurora estava linda, lúcida, feliz e bebendo uma cervejinha. Guto pegou uma garrafa de Itaipava e foi brindar com ela. A esfuziante tia Marlene chegou. Abraçou o sobrinho e quando uma parenta perguntou quando ele ia casar, Marlene respondeu por ele: “Casa não, meu sobrinho. Curta a vida lá em São Paulo. Eu digo isso pro Vinny: não case. Falando nisso, TIIIIIIIIIII, VEM CÁ!!!!!”
A tia chamou o primo chato. Foi quando duas emoções tomaram conta de Guto. A primeira, a visão daquele moreno lindíssimo, cabelos escuros, um sorriso lindo no rosto, abrilhantado por um par de olhos esverdeados hipnotizantes, um par de covinhas no rosto e um belo furo no queixo. A outra emoção foi a sensação de tê-lo visto em algum lugar. Os dois trocaram um forte abraço, sob as bênçãos de tia Marlene.
Guto tomava uma cerveja quando Tiago chegou para conversar...
- Bom ver você aqui. Há quanto tempo...
- Dezoito anos. Eu tinha doze quando fui pra São Paulo.
- Eu estou lá há seis. Fiz faculdade e agora trabalho.
- Mora onde lá?
- Pinheiros, perto da Faria Lima, e você?
- Paraíso, perto da Avenida Paulista... Está casado? Namorando?
- Não – Guto percebeu um certo desconforto no primo –, faz dois meses que terminei um namoro.





Guto estava curtindo a balada quando percebeu aquele rapaz olhando-o. Retribuiu o olhar com um sorriso. Ficaram na troca de olhares e sorrisos por alguns minutos. Ate que um moreno voltou do banheiro e beijou o rapaz, que passou a disfarçar as olhadas para Guto. O moreno era Tiago.





- Desculpe ter perguntado... Mas, mudando de assunto... Você era tão chato, tão magrelo, tão chorão – ele se lembrou do primo na balada, só precisava “dar o recado” – o tempo fez bem pra você. Está um belo homem – disse, olhando-o de cima a baixo.
- Obrigado – encabulou-se e olhou para o chão, onde foi procurar a coragem para dizer –, você também está muito bonito.
Churrasco rolando, crianças na piscina, os sobrinhos de Guto alugando deliciosamente o tio, ele pediu um tempo e foi sentar-se na varanda. Tiago estava lá.
- Cansou, primo?
- Já deu por hoje! Queria era dormir um pouco.
- Viaja amanhã?
- Sim, vou no ônibus das cinco.
- Eu sairei umas 8. Não quero pegar trânsito na chegada. Quer ir comigo?
- Eu já comprei a passagem!
Alguém se mete na conversa...
- Não se preocupe, Ti, seu pai vende a passagem – a onipresença de Tia Marlene é algo fascinante às vezes –. Eu vou ficar mais tranquila se você for com seu primo.
- Mas, mãe...
- Assunto encerrado! Guto, ele vai com você.
O que se desenhava um fim de semana enfadonho, de repente se transformava em algo deliciosamente surpreendente. Na hora de ir embora, uma conversa com a mãe:
- Filho, tome cuidado.
- Relaxa, mãe, vou até mais devagar.
- Estou falando do Tiago. Será que meu sobrinho vai virar meu genro?
- Se virar, a senhora será a primeira a saber.
- Ah, sei não, do jeito a Marlene é, acho que serei a segunda.
- Te amo, mãe – Guto abraçou-a com o mesmo calor da ansiedade pela viagem de volta a São Paulo.

7 comentários:

FOXX disse...

tem q ler tudo pra entender?

Vivi Righi disse...

Querido amigo,

Já li três postagens por aqui e os textos são tão interessantes que nos prendem a atenção, pois são escritos de forma leve e descontraída, além de terem sido muito bem escritos, por sinal. Outra coisa: parece que você curte muito Legião Urbana, Renato Russo... ponto pra você, pois eu também adoro!

A proposta do blog é louvável, pois você está mostrando detalhes da vida homossexual de forma natural e intensa, deixando bem claro que um homossexual é uma pessoa como outra qualquer. Que trabalha, estuda, tem seus desafios, seus direitos e deveres, suas dificuldades e que, acima de tudo, são totalmente capazes de amar de verdade. Não precisam ser "desbandeirados"... Podem ser pessoas com comportamento normal, bons profissionais, bons amigos, bons filhos, apenas com uma opção sexual diferenciada. E isso para mim não tem problema algum, desde que exista o respeito.

Grande abraço pra você e boa sorte por aqui! Tudo numa boa!!!

Ana Claudia disse...

HUmmm... as vezes a gente não quer ir à algum lugar, achando que vai ser chato, mas acaba sendo muito bom...
Amei a historia
Até mais!

Lobo disse...

Com uma família assim, tudo fica mais fácil XD

Rapha disse...

Gente... Se há algo depois disso para ser contado eu preciso saber JÁ!!

bjs

railer disse...

legal e surpreendente.

você escreve muito bem.

Claudia Alves disse...

Senti agora a emoção de um caso entre primos.
Pra mim é uma coisa tão natural e tão gostosa, diferente.
Essa história me lembrou a minha própria história com um primo que nem vejo mais.
Boas recordações.
http://claudiaalvesinteriores.blogspot.com/